Esse é um dos muitos projetos que eu venho desenvolvendo. "Um Novo Mundo" faria parte do livro de contos envolvendo os personagens de Eventyr (apesar da história não ter relação nenhuma com a saga de Beatriz Misse). Minha ideia inicial era colocar, junto com os "Contos de Ofir", capítulos especiais de alguns dos meus trabalhos futuros. Eram capítulos que não estaria inclusos no projetos originais, mas serviriam para apresentar os personagens, o universo e a história principal de cada projeto. A ideia acabou sendo abortada por falta de tempo e esse capítulo sequer foi finalizado, mas ainda vale para instigar a curiosidade.
– Estou quase conseguindo! – disse Tomás – Só mais um pouquinho!
– Rápido Tomás! – Ana sussurrou.
– Estou fazendo o melhor que posso. – Tomás resmungou – Lembre-se que sou apenas um velho jardineiro.
– E excelente marinheiro! – Duda sempre gostava de elogiar-lo.
– Se fosse tão excelente não estaríamos aqui e sim na casa da mãe de senhorita Elizabete. – brinquei.
– Poderia acontecer com qualquer um. – Duda se zangou.
– Deixe-me subir e ajudar? – já era a terceira vez que Pablo pedia isso.
– Eu vou resolver essa situação do meu jeito. – Tomás agora estava sério – Não é a primeira vez que fico preso de cabeça para baixo em uma armadilha tão arcaica como essa.
– Mas funcionou! – lembrei.
– E se estou nesta situação é por culpa sua Téo! – Tomás parecia estar bravo, mas sabia que apenas não queria parecer um tolo.
– Poderiam aparecer intrusos! – fiz minha defesa – Desde que saímos da Mansão Vanderrel só encontramos perigo. Vai saber o que nos aguarda nessa terra desconhecida?
– Você tem toda razão, mas precisava fazer isso na entrada da cabana? – Tomás não estava conseguindo se soltar.
– Tem certeza de que não precisa de ajuda Tomás? – Pablo pela quarta vez.
– Venha garoto! – Tomás ergueu as mãos em sinal de rendição – Faça como quiser.
– Ótimo! – Pablo se animou – Vejamos... Posso subir naquela árvore...
– Garoto – agora Tomás se dirigia a mim – Tu é bom para dar nós!
– Obrigado. – respondi sorrindo.
Pablo não perdeu tempo. Subiu na árvore ao lado da cabana, pulou no tronco da outra árvore mais acima e seguiu para o galho onde a armadilha estava montada. Ele era bom para essas coisas. Primeiro ele conferiu o nó, quando viu que realmente era um excelente nó – eu sou bom nisso – puxou a faca da cintura e cortou a corda.
– Finalmente livre! – Tomás estava com o rosto vermelhinho.
– Muito bem Pablo! – Duda batia palmas – Você foi o herói da noite.
– Maria Eduarda – Ana olhou feio para ela – menos.
– Deixe a menina. – Tomás sorriu – Pode não ter sido exatamente um ato heróico dos quais vocês sempre lêem no livros, mas foi um grande feito. Quem iria cozinhar para vocês hoje?
– A comida da Ana é terrível! – impliquei.
– Faça melhor seu projeto inacabado de homem. – Ana bufou – Eu ainda estou aprendendo.
– Parem os dois. – Tomás agora estava bem mais tranquilo – Não estamos em condições de brigar. Temos que nos unir e juntar forças para construir uma jangada e voltar para Vanderrel.
– Não! – gritei – Para aquela mansão eu não volto mais.
– Não seja teimoso. – Pablo tentava parecer o que ele imaginava que era o papai – Já está tudo certo para irmos de volta a Vanderrel. Nós já sabemos que existe um mundo para onde podemos ir. Não seremos prisioneiros novamente.
– Quem garante? – fechei o rosto – A Sra. Vanderrel é uma bruxa. Pode muito bem nos trancafiar em um daqueles quartos e jogar a chave fora.
– Não acredito que a Elizabete deixaria a Sra. Vanderrel fazer isso. – Tomás tentava me acalmar – Ela é uma boa moça. Se eu fosse alguns anos mais jovem...
– Não iria fazer nada. – brinquei – Tímido do jeito que o senhor é. Não conseguiria nem convidá-la para tomar um chá.
– Não seja tão rude Téo! – Duda o defendeu.
Duda sempre teve Tomás como um pai. Na verdade todos nós meio que sempre tivemos o Tomás como pai. Ele é a única imagem masculina que temos. Mesmo tendo outros criados homens na mansão, Tomás é o único que fala conosco sem parecer um general ou um robô do mal.
Entramos na cabana. Já estava começando a anoitecer. Ainda não havíamos explorado toda a ilha e nem sabíamos exatamente quem ou o que poderíamos encontrar naquele lugar. Era assustador, mas também era muito emocionante.
Tomás preparou nossa comida. Peixes e frutas. Eram as únicas coisas que encontrávamos naquela ilha. Mas o Tomás tinha vários dons e cozinhar era um deles. Ele cozinhava maravilhas e fazia milagres com esses ingredientes.
– Estava uma delicia! – Duda sorria com o rosto lambuzado – Como sempre. Você é um gênio Tomás.
– Obrigado Duda. – Tomás sorriu – Acho que é minha única fã.
– Tomás! – disse alto – Sabe que também sou seu fã.
– Todos já terminaram? – Tomás se levantou – Muito bem, agora já para cama!
– Mas já? – Ana perguntou.
– Sim senhorita! – Tomás sorriu – E o senhor também Teodoro!
– Tomás – embirrei – Eu posso ajudar a vigiar!
– Eu e o Pablo já bastamos! – Tomás agora deixava no canto seu lado brincalhão – Entre e durma!
Eu detestava quando me tratavam como criança. Se não fosse por mim nunca teríamos saído de Vanderrel. Ainda seriamos prisioneiros da Sra. Anete e continuaríamos achando que Vanderrel era o único lugar do planeta.
Tentei dormir, mas não consegui. Algo estava me mantendo acordado naquela noite. Era como se alguma coisa dentro de mim soubesse o que iria acontecer.
Não demorou muito para surgir sons de passos. Eram sons baixos. Muito baixos para serem ouvidos de longe. E se eu já estava ouvindo significava que eles já estavam bem perto.
– Mas o que está...?
Não deu tempo sequer de terminar a pergunta. Quando sai da barraca vi Tomás, Pablo, Ana e Duda amarrados e sendo levadas por vários homens. Estava muito escuro, mas podia jurar que pareciam os índios que li nos livros. A última coisa que me lembro foi sentir uma grande dor de cabeça.
Quando comecei a acordar ouvi várias vozes falando ao mesmo tempo. Não sabia se estavam realmente todos estavam falando juntos ou se era a minha mente que estava interpretando de tal forma.
Abri os olhos e só então pude perceber que estava de cabeça para baixo. Olhei para os lados e vi Tomás e Ana no meu lado esquerdo e Pablo e Duda do meu lado direito. Com exceção da Duda, todos eles também estavam virados de cabeça para baixo.
Estávamos amarrados a troncos aparentemente enormes. As cordas pareciam feitas de cipó. Muitos cipós e estavam bem apertadas.
– O que está acontecendo? – perguntei ao Tomás.
– Acho que fomos capturados por índios. – Tomás sussurrou.
– Índios?! – quase gritei.
– Fique quieto! – Tomás continuou sussurrando.
– Índios?! – comecei a sussurrar também – Como sabe?
– Pelo fato de estarmos todos amarrados com cipó em troncos de árvores. – Tomás não parecia muito feliz. Isso era compreensível.
– Acho que estou começando a me recordar! – tentei coçar a cabeça por impulso. O cipó pareceu ficar mais apertado depois disso.
– Eu vi quando você saiu da cabana! – Ana falou um pouco mais alto – Poderia ter feito alguma coisa.
– Eu? – quase gritei novamente.
– Acalmem-se – Pablo chamou a nossa atenção para o outro lado – A Duda está ficando assustada.
– Veja! – Ana disse assustada – Está vindo alguém.
– São esses os invasores que encontramos. – não consegui identificar o rosto de quem falava. Mas a voz parecia vir da esquerda.
– Desculpe, mas nós não somos exatamente invasores. – Pablo tentou argumentar.
Apesar de não conseguir enxergar direito devido a pouca luz e principalmente por estar de cabeça para baixo, acredito que eram três homens que estavam a nossa frente. Não sei se é possível ver o humor de uma pessoa pelo pé, mas eles pareciam pés bem nervosos.
– Roupas estranhas para ser da tribo Kaliska. – o do meio falou – É também muito estranhas para serem os Pakwa. São de fora, com certeza.
– O que fazer com eles Guia? – o da direita perguntou.
– Tudo o que eles vestem. Retirem! – o tal Guia me assustou.
– Espere um minuto! – tentei me soltar e quase quebrei o pescoço – Vai nos deixar nus?
– Guia! – uma quarta pessoa chegou gritando – Os Kaliskas chegaram.
– Rápido! – o Guia saiu do meu campo de visão – Tragam todos os homens. Qual quer cuidado é pouco. Os Kaliska já fizeram um grande mal a todos dessa tribo.
– Mas Guia, o senhor vai receber-los mesmo depois de tudo o que fizeram para nós, os Doyas? – o da direita agora sumia do meu campo de visão.
– Se queremos vingar a desgraça que os Kaliska fizeram a nossa tribo teremos que agir pacificamente.
– E os invasores? – o da esquerda perguntou.
– Desamarre-os e levem até a minha cabana. – a voz do Guia ficou mais fraca.
– De roupa certo? – estava preocupado.
Fomos desamarrados e levados para a cabana conforme o Guia exigiu. E fomos acompanhados por mais cinco índios. Eles realmente são uma tribo muito desconfiada. Mas me conhecendo como eu conheço, também desconfiaria.
– Guia? – um deles entrou na cabana – Os invasores.
– Muito bem – ouvi a voz do Guia – Faça-os entrar.
Fomos empurrados para dentro da cabana. Não havia nada de extraordinário. Era apenas uma grande casa de madeira forrada com lã e palha. Não havia móveis, não havia armas, apenas um tapete rodado.
Lá dentro havia quatro homens vestindo um tipo de túnica vermelha, com um pintura vermelha e preta que contornava o olho esquerdo e seguia pelo pescoço até o outro lado, contornando o olho direto. Eles tinham um olhar pacificamente furiosos – por mais estranho que pareça.
O Guia estava ao lado da entrada. Ele estava sem camisa, apenas uma calça bege e um sinto que parecia ser feito de pele de cobra. Em seu peito estavam desenhado listras verticais azuis e listras horizontais verdes. Depois que fui reparar que os outros índios tinham apenas as listras horizontais, mas eram em um tom de verde mais claro.
– O que significa para vocês? – o Guia perguntou olhando para nós.
– Absolutamente nada. – O Kaliska do meio falou.
– Ótimo. – o guia sorriu – Podem levar-los.
– Devemos prender-los novamente? – o índio que nos fez entrar perguntou.
– Não. – o Guia continuava sorrindo – Apenas certifiquem-se de que eles não irão fugir.
– Mas Guia...
– Será apenas isso! – o Guia falou alto e em um tom mais sério – Por hora será apenas isso.
Os índios nos levaram para outra cabana. Desta vez bem menor que a cabana do Guia. Novamente fomos empurrados para dentro da cabana que também estava vazia.
– Mas o que eles pretendem fazer com a gente? – Pablo perguntou.
– Estou tão perdido quanto você! – respondi baixinho.
– Isso é tudo culpa sua! – Ana estava irritada. Como sempre.
– Culpa minha? – estranhei – O que foi que eu fiz? Posso saber?
– Você não fez nada! – Ana bufou – E foi justamente esse o problema!
– Mas o que eu poderia ter feito? – resmunguei.
– Ana! – Tomás falou alto – Não perturbe seu irmão desta forma. Ele não podia fazer nada. Eu que sou o mais velho, eu quem deveria ter feito algo.
– Mas você fez! – Duda tentou consolar Tomás – Tentou lutar contra os índios.
– Mas eles foram mais fortes. – Tomás lamentou.
– Agora o que foi já foi. – Pablo falou em um tom sério – Não vai adiantar ficar cobrando o que poderia ter sido feito. Temos que pensar agora no que poderemos fazer.
– Rápido Tomás! – Ana sussurrou.
– Estou fazendo o melhor que posso. – Tomás resmungou – Lembre-se que sou apenas um velho jardineiro.
– E excelente marinheiro! – Duda sempre gostava de elogiar-lo.
– Se fosse tão excelente não estaríamos aqui e sim na casa da mãe de senhorita Elizabete. – brinquei.
– Poderia acontecer com qualquer um. – Duda se zangou.
– Deixe-me subir e ajudar? – já era a terceira vez que Pablo pedia isso.
– Eu vou resolver essa situação do meu jeito. – Tomás agora estava sério – Não é a primeira vez que fico preso de cabeça para baixo em uma armadilha tão arcaica como essa.
– Mas funcionou! – lembrei.
– E se estou nesta situação é por culpa sua Téo! – Tomás parecia estar bravo, mas sabia que apenas não queria parecer um tolo.
– Poderiam aparecer intrusos! – fiz minha defesa – Desde que saímos da Mansão Vanderrel só encontramos perigo. Vai saber o que nos aguarda nessa terra desconhecida?
– Você tem toda razão, mas precisava fazer isso na entrada da cabana? – Tomás não estava conseguindo se soltar.
– Tem certeza de que não precisa de ajuda Tomás? – Pablo pela quarta vez.
– Venha garoto! – Tomás ergueu as mãos em sinal de rendição – Faça como quiser.
– Ótimo! – Pablo se animou – Vejamos... Posso subir naquela árvore...
– Garoto – agora Tomás se dirigia a mim – Tu é bom para dar nós!
– Obrigado. – respondi sorrindo.
Pablo não perdeu tempo. Subiu na árvore ao lado da cabana, pulou no tronco da outra árvore mais acima e seguiu para o galho onde a armadilha estava montada. Ele era bom para essas coisas. Primeiro ele conferiu o nó, quando viu que realmente era um excelente nó – eu sou bom nisso – puxou a faca da cintura e cortou a corda.
– Finalmente livre! – Tomás estava com o rosto vermelhinho.
– Muito bem Pablo! – Duda batia palmas – Você foi o herói da noite.
– Maria Eduarda – Ana olhou feio para ela – menos.
– Deixe a menina. – Tomás sorriu – Pode não ter sido exatamente um ato heróico dos quais vocês sempre lêem no livros, mas foi um grande feito. Quem iria cozinhar para vocês hoje?
– A comida da Ana é terrível! – impliquei.
– Faça melhor seu projeto inacabado de homem. – Ana bufou – Eu ainda estou aprendendo.
– Parem os dois. – Tomás agora estava bem mais tranquilo – Não estamos em condições de brigar. Temos que nos unir e juntar forças para construir uma jangada e voltar para Vanderrel.
– Não! – gritei – Para aquela mansão eu não volto mais.
– Não seja teimoso. – Pablo tentava parecer o que ele imaginava que era o papai – Já está tudo certo para irmos de volta a Vanderrel. Nós já sabemos que existe um mundo para onde podemos ir. Não seremos prisioneiros novamente.
– Quem garante? – fechei o rosto – A Sra. Vanderrel é uma bruxa. Pode muito bem nos trancafiar em um daqueles quartos e jogar a chave fora.
– Não acredito que a Elizabete deixaria a Sra. Vanderrel fazer isso. – Tomás tentava me acalmar – Ela é uma boa moça. Se eu fosse alguns anos mais jovem...
– Não iria fazer nada. – brinquei – Tímido do jeito que o senhor é. Não conseguiria nem convidá-la para tomar um chá.
– Não seja tão rude Téo! – Duda o defendeu.
Duda sempre teve Tomás como um pai. Na verdade todos nós meio que sempre tivemos o Tomás como pai. Ele é a única imagem masculina que temos. Mesmo tendo outros criados homens na mansão, Tomás é o único que fala conosco sem parecer um general ou um robô do mal.
Entramos na cabana. Já estava começando a anoitecer. Ainda não havíamos explorado toda a ilha e nem sabíamos exatamente quem ou o que poderíamos encontrar naquele lugar. Era assustador, mas também era muito emocionante.
Tomás preparou nossa comida. Peixes e frutas. Eram as únicas coisas que encontrávamos naquela ilha. Mas o Tomás tinha vários dons e cozinhar era um deles. Ele cozinhava maravilhas e fazia milagres com esses ingredientes.
– Estava uma delicia! – Duda sorria com o rosto lambuzado – Como sempre. Você é um gênio Tomás.
– Obrigado Duda. – Tomás sorriu – Acho que é minha única fã.
– Tomás! – disse alto – Sabe que também sou seu fã.
– Todos já terminaram? – Tomás se levantou – Muito bem, agora já para cama!
– Mas já? – Ana perguntou.
– Sim senhorita! – Tomás sorriu – E o senhor também Teodoro!
– Tomás – embirrei – Eu posso ajudar a vigiar!
– Eu e o Pablo já bastamos! – Tomás agora deixava no canto seu lado brincalhão – Entre e durma!
Eu detestava quando me tratavam como criança. Se não fosse por mim nunca teríamos saído de Vanderrel. Ainda seriamos prisioneiros da Sra. Anete e continuaríamos achando que Vanderrel era o único lugar do planeta.
Tentei dormir, mas não consegui. Algo estava me mantendo acordado naquela noite. Era como se alguma coisa dentro de mim soubesse o que iria acontecer.
Não demorou muito para surgir sons de passos. Eram sons baixos. Muito baixos para serem ouvidos de longe. E se eu já estava ouvindo significava que eles já estavam bem perto.
– Mas o que está...?
Não deu tempo sequer de terminar a pergunta. Quando sai da barraca vi Tomás, Pablo, Ana e Duda amarrados e sendo levadas por vários homens. Estava muito escuro, mas podia jurar que pareciam os índios que li nos livros. A última coisa que me lembro foi sentir uma grande dor de cabeça.
Quando comecei a acordar ouvi várias vozes falando ao mesmo tempo. Não sabia se estavam realmente todos estavam falando juntos ou se era a minha mente que estava interpretando de tal forma.
Abri os olhos e só então pude perceber que estava de cabeça para baixo. Olhei para os lados e vi Tomás e Ana no meu lado esquerdo e Pablo e Duda do meu lado direito. Com exceção da Duda, todos eles também estavam virados de cabeça para baixo.
Estávamos amarrados a troncos aparentemente enormes. As cordas pareciam feitas de cipó. Muitos cipós e estavam bem apertadas.
– O que está acontecendo? – perguntei ao Tomás.
– Acho que fomos capturados por índios. – Tomás sussurrou.
– Índios?! – quase gritei.
– Fique quieto! – Tomás continuou sussurrando.
– Índios?! – comecei a sussurrar também – Como sabe?
– Pelo fato de estarmos todos amarrados com cipó em troncos de árvores. – Tomás não parecia muito feliz. Isso era compreensível.
– Acho que estou começando a me recordar! – tentei coçar a cabeça por impulso. O cipó pareceu ficar mais apertado depois disso.
– Eu vi quando você saiu da cabana! – Ana falou um pouco mais alto – Poderia ter feito alguma coisa.
– Eu? – quase gritei novamente.
– Acalmem-se – Pablo chamou a nossa atenção para o outro lado – A Duda está ficando assustada.
– Veja! – Ana disse assustada – Está vindo alguém.
– São esses os invasores que encontramos. – não consegui identificar o rosto de quem falava. Mas a voz parecia vir da esquerda.
– Desculpe, mas nós não somos exatamente invasores. – Pablo tentou argumentar.
Apesar de não conseguir enxergar direito devido a pouca luz e principalmente por estar de cabeça para baixo, acredito que eram três homens que estavam a nossa frente. Não sei se é possível ver o humor de uma pessoa pelo pé, mas eles pareciam pés bem nervosos.
– Roupas estranhas para ser da tribo Kaliska. – o do meio falou – É também muito estranhas para serem os Pakwa. São de fora, com certeza.
– O que fazer com eles Guia? – o da direita perguntou.
– Tudo o que eles vestem. Retirem! – o tal Guia me assustou.
– Espere um minuto! – tentei me soltar e quase quebrei o pescoço – Vai nos deixar nus?
– Guia! – uma quarta pessoa chegou gritando – Os Kaliskas chegaram.
– Rápido! – o Guia saiu do meu campo de visão – Tragam todos os homens. Qual quer cuidado é pouco. Os Kaliska já fizeram um grande mal a todos dessa tribo.
– Mas Guia, o senhor vai receber-los mesmo depois de tudo o que fizeram para nós, os Doyas? – o da direita agora sumia do meu campo de visão.
– Se queremos vingar a desgraça que os Kaliska fizeram a nossa tribo teremos que agir pacificamente.
– E os invasores? – o da esquerda perguntou.
– Desamarre-os e levem até a minha cabana. – a voz do Guia ficou mais fraca.
– De roupa certo? – estava preocupado.
Fomos desamarrados e levados para a cabana conforme o Guia exigiu. E fomos acompanhados por mais cinco índios. Eles realmente são uma tribo muito desconfiada. Mas me conhecendo como eu conheço, também desconfiaria.
– Guia? – um deles entrou na cabana – Os invasores.
– Muito bem – ouvi a voz do Guia – Faça-os entrar.
Fomos empurrados para dentro da cabana. Não havia nada de extraordinário. Era apenas uma grande casa de madeira forrada com lã e palha. Não havia móveis, não havia armas, apenas um tapete rodado.
Lá dentro havia quatro homens vestindo um tipo de túnica vermelha, com um pintura vermelha e preta que contornava o olho esquerdo e seguia pelo pescoço até o outro lado, contornando o olho direto. Eles tinham um olhar pacificamente furiosos – por mais estranho que pareça.
O Guia estava ao lado da entrada. Ele estava sem camisa, apenas uma calça bege e um sinto que parecia ser feito de pele de cobra. Em seu peito estavam desenhado listras verticais azuis e listras horizontais verdes. Depois que fui reparar que os outros índios tinham apenas as listras horizontais, mas eram em um tom de verde mais claro.
– O que significa para vocês? – o Guia perguntou olhando para nós.
– Absolutamente nada. – O Kaliska do meio falou.
– Ótimo. – o guia sorriu – Podem levar-los.
– Devemos prender-los novamente? – o índio que nos fez entrar perguntou.
– Não. – o Guia continuava sorrindo – Apenas certifiquem-se de que eles não irão fugir.
– Mas Guia...
– Será apenas isso! – o Guia falou alto e em um tom mais sério – Por hora será apenas isso.
Os índios nos levaram para outra cabana. Desta vez bem menor que a cabana do Guia. Novamente fomos empurrados para dentro da cabana que também estava vazia.
– Mas o que eles pretendem fazer com a gente? – Pablo perguntou.
– Estou tão perdido quanto você! – respondi baixinho.
– Isso é tudo culpa sua! – Ana estava irritada. Como sempre.
– Culpa minha? – estranhei – O que foi que eu fiz? Posso saber?
– Você não fez nada! – Ana bufou – E foi justamente esse o problema!
– Mas o que eu poderia ter feito? – resmunguei.
– Ana! – Tomás falou alto – Não perturbe seu irmão desta forma. Ele não podia fazer nada. Eu que sou o mais velho, eu quem deveria ter feito algo.
– Mas você fez! – Duda tentou consolar Tomás – Tentou lutar contra os índios.
– Mas eles foram mais fortes. – Tomás lamentou.
– Agora o que foi já foi. – Pablo falou em um tom sério – Não vai adiantar ficar cobrando o que poderia ter sido feito. Temos que pensar agora no que poderemos fazer.