Rei Céleo ficou um misto de espanto, alegria e preocupação. Ele parecia não saber o que demonstrar primeiro e olhava fixamente para a Rainha Alina.
– O que está acontecendo aqui? – Céleo perguntou esfregando os olhos.
– Papai, eu consegui. Nós conseguimos! – Alexis disse olhando para mim – Achamos a mamãe!
– Mas como? – Céleo se aproximou – Vocês são loucos?
– Talvez, mas se não fosse essa loucura nunca teríamos encontrado a mamãe! – Alexis estava com Alina no colo.
– Mas é ela mesma! – Céleo passava a mão no rosto de Alina – Ela está tão pálida. Desacordada. O que aconteceu?
– Bianor estava mantendo a rainha presa e usando suas energias mágicas para alimentar um labirinto subterrâneo em Calidora. – respondi – A rainha já havia me mostrado aquele lugar antes, mas foi Alexis quem o encontrou.
– Fizemos um belo trabalho de equipe! – Alexis sorriu e segurou minha mão.
– Mas a rainha está muito mal! – voltei às atenções a Alina – Ela precisa urgentemente de cuidados médicos.
– Eu estou vendo! – Céleo a pegou no colo – Vamos! Irei levar-la para o quarto.
Rei Céleo chamou alguns guardas e pediu para chamarem o médico do castelo imediatamente e que também chamasse o conselho da Capital. A principio estranhei o rei ter convocado o conselho da Capital, só depois imaginei que era para anunciar que a rainha havia sido encontrada. Mas logo em seguida lembrei-me de outro motivo tão urgente quanto esse para comunicar ao conselho.
– Rei Céleo? – chamei quando ele colocou Alina na cama – Preciso contar algo. Não sei se já ficou sabendo, mas a Rainha Alina previu uma invasão de Bianor e seu exercito para breve. Eles já devem estar a caminho e não demorarão muito para chegarem.
– Invasão? – Céleo se assustou – Eu não fiquei sabendo de nada. Uma invasão... Não estamos devidamente preparados para uma invasão.
– Foi o que eu imaginei, por isso resolvi avisar o quanto antes. – disse séria.
– Fez bem. Muito obrigado. – Céleo colocou a mão em meu ombro – Preciso comunicar isso imediatamente ao conselho. Precisamos tomar providencias o mais rápido possível.
– Eu queria dizer que estou aqui para o que precisar! – disse confiante.
– E iremos precisar. – Céleo disse apreensivo – Você é nossa última esperança. A nova esperança.
– Eu farei de tudo para não decepcionar-los! – falei já sentindo o peso da responsabilidade.
Sempre soube que um dia iria ter que salvar Ofir, mas nunca havia sentido esse peso antes. É como se todo o peso do mundo estivesse em minhas costas e eu não pudesse aguentar. E o pior é que o peso de um mundo realmente estava nas minhas costas, não era apenas uma forma de dizer.
– Alexis, eu irei para a casa de Neandro. – disse baixo – Devem estar todos querendo saber notícias de nós.
– E eles estão aqui? – Alexis perguntou.
– Em Calidora pelo menos eles não foram. – lembrei.
– Espere um pouco, só até os médicos chegarem, alias estão demorando demais. Eu irei com você até a casa de Neandro.
– Tudo bem. – sorri – Eu também quero saber notícias da rainha.
– Majestade? – um dos guardas entrou no quarto – Os médicos chegaram!
– Mande-os entrar! – Céleo disse apressado.
Os médicos examinaram a Rainha Alina de uma forma diferente. Eles usavam magia. E eram vários médicos examinando ao mesmo tempo. Enquanto um examinava a cabeça, outro examinava a barriga, outro os braços e mais um examinando as pernas.
O Rei Céleo estava apreensivo e parecia não gostar nada da demora em que os médicos estavam examinando a Rainha Alina.
– Ela vai ficar bem! – disse tentando acalmar Céleo.
– Eu espero que sim. – ele olhou inquieto para Alina.
Os médicos terminaram de examinar a Rainha Alina e pediram para conversar com o Rei Céleo em particular. Eles ficaram algum tempo conversando, mas o Rei Céleo parecia mais aliviado. Não devia ter acontecido nada demais com a Rainha Alina.
– E então? – Alexis perguntou quando Céleo se aproximou.
– Ela passou muito tempo sendo explorada por Bianor e isso a enfraqueceu demais. – Céleo parecia bem mais aliviado – Ela vai ficar bem, só precisa de cuidados. Só me preocupo com essa guerra que parece não ter mais como fugir. Eu não sei se conseguiremos nos manter firme. Estamos enfraquecidos e o exército de Bianor é grande demais para competirmos.
– Calma Rei Céleo, nós estamos aqui! – disse em um tom animador.
– Como disse, você é nossa esperança nesta inevitável guerra. – ele sorriu.
Sai do quarto e Alexis veio atrás. Ele me abraçou como se soubesse de minhas novas inseguranças – e talvez realmente soubesse. Consegui não cair em lágrimas e ficar contente pela Rainha Alina. Não sei se seria uma boa hora para ficar me lamentando de um destino incerto.
– Vamos para a casa de Neandro? – perguntei sorrindo.
Alexis não disse nada, apenas assentiu sorrindo. Mesmo ainda não sendo comunicados sobre a possível invasão de Bianor, os guardas da Capital estavam todos bem alertas, não pareciam tão despreparados como o Rei Céleo dizia. Mas eu também não tinha visto ainda o tamanho e nem a competência do exercito de Bianor que contava com homens de dois reinos. Provavelmente apenas os melhores de cada reino foram chamados para essa batalha, mas ainda tinha alguma esperança de que o nosso exército ser o suficiente para lutar contra Bianor.
Chegamos à casa de Neandro ainda à tarde. Assim como eu havia imaginado, estavam todos lá. Todos mesmo. A casa de Neandro havia se tornado quase que um tipo de pensão, abrigando todos que estavam ligados a minha missão.
Além de Linfa, Neandro, Tales, Thalassa e Nicardo estavam na casa Camila, Levinda e Layla. Apenas Cosmo não estava presente. Não sabia como eles estavam abrigando tanta gente em uma casa tão pequena, mas pareciam estar todos muito confortáveis.
– Olha quem apareceu! – Neandro falou quando nos viu na porta – Os fujões!
– Beatriz! Alexis! – Thalassa correu para nos abraçar – Achei que tivesse acontecido o pior.
– Calma Thalassa. – sorri – Estamos todos bem. Pelo menos por enquanto.
Contamos a eles toda a nossa viagem ao castelo, o plano de Alexis, o labirinto, o resgate da Rainha Alina e sobre a invasão de Bianor. A noticia da invasão não pareceu ser surpresa para eles como foi para o Rei Céleo.
– Eu sonhei com isso. – Nicardo falou – Eu vi Bianor e seu exercito chegando a Capital e destruindo tudo. Fazendo com a Capital o mesmo que fizeram com Sotero, Leander e Menelau.
– Menelau também foi destruída? – perguntei assustada.
– Não como aconteceu com Sotero e Leander, mas ela foi atacada. – Nicardo estava sério.
– Destruíram toda a cidade do castelo, assim como o castelo também. – Tales continuou – Bianor conseguiu, a força, o comando de Menelau e só por isso não destruiu o reino inteiro.
– Mas isso é terrível! – lastimei.
– Isso é mais que terrível! – Nicardo me olhava triste – Isso é o inicio do fim. As tropas de Bianor acabaram ganhando mais um reforço.
Era estranho olhar para Nicardo agora. Principalmente depois de tudo o que havia acontecido comigo na minha viagem com Alexis. Não conseguia olhar em seus olhos. Sentia como se estivesse em divida com o Nicardo. E talvez esse sentimento continuasse dentro de mim enquanto eu não tivesse certeza de que ele está feliz de verdade.
– Acho que a visão da rainha e a confirmação que estávamos esperando. – Tales falou em um tom estratégico – Já podemos começar a por em prática o nosso plano.
– Que plano? – Alexis perguntou.
– Não acredito que será possível impedir a entrada de Bianor no reino, mas podemos diminuir a carga para facilitar a vida do exército da Capital. – Tales se aproximou um pouco mais de nós.
– E o que pretende fazer? – perguntei.
– Cosmo foi até Leander buscar os meus homens e iremos reforçar a tropa. Eles são homens fortes e a batalha que todos eles enfrentaram só os tornou ainda mais fortes. Ficaremos a postos no porto, eles terão que passar por ali. Provavelmente invadirão já atacando, ainda mais depois de nos ver esperando por eles. A intenção é impedir que eles prossigam, mas acredito que muitos conseguirão passar pela nossa barreira e chegar ao castelo. Invadirão a Capital, mas o número será menor e mais fácil de lutar.
– Uma idéia um pouco maluca e arriscada, mas quem sou eu para julgar planos malucos e arriscados? – Alexis pareceu gostar da idéia.
– Mas você disse bem – eu não estava gostando da idéia – É muito arriscado!
– Mas é nossa única opção no momento. – Neandro falou.
– Você também está de acordo com esse plano? – perguntei.
– Beatriz, é o que podemos fazer. – Linfa sorriu tentando me convencer, mas ela também não parecia gostar do plano.
– E as pessoas de Tales? – perguntei – Toda batalha dessa dimensão sempre acabam em mortes.
– Mas se o exército de Bianor chegar ao castelo vai haver muito mais mortes! – Neandro defendeu a idéia.
– Meus homens sabem dos riscos de uma batalha e estão todos prontos para o pior. – Tales parecia um pouco preocupado – Mas eles farão o impossível para não morrer, isso eu posso garantir!
– O fato é que não temos muitas escolhas. – Nicardo também defendeu a idéia – Se o exército de Bianor atacar inteiro o castelo nós não teremos chance nenhuma. Mesmo tendo você no grupo.
– O exército dele é tão forte assim? – perguntei assustada.
– São os melhores dos melhores! – Tales falou assustado – Beatriz, eu vi o que o exército dele é capaz de fazer quando eles não eram nem a metade do que é hoje. Por isso não temos esperanças de parar-los nesse plano e é por isso que precisamos eliminar o máximo de pessoas possível para atacar o castelo.
– Mas se lutarmos antes você acha que seus homens, os que sobrarem, terá forças para ajudar em outra batalha? – tentei ser realista.
– Eles lutaram até o fim, isso posso garantir! – Tales disse confiante, mas parecia preocupado com alguma coisa.
– Isso é loucura demais! – disse pra mim mesma.
– Beatriz, se meter em um labirinto que poderia te levar a morte não é algo muito prudente. – Nicardo falou tentando não parecer ressentido.
– A situação era diferente. – tentei me justificar – Era uma situação de urgência!
– E essa não é uma situação de urgência? – Neandro perguntou.
– Não sei se gosto da idéia de por outras pessoas em risco. – disse – Eu deveria enfrentar essa guerra sozinha. Não é assim que a profecia diz?
– Isso sim é loucura! – Alexis falou alto – Você acha mesmo que conseguiria vencer um exército inteiro?
– Mas não é essa a profecia? – também falei alto.
– Não. – Neandro normalizou nossos tons de voz – A profecia diz que você salvará Ofir, mas isso pode ser de várias formas. Não quer dizer que você, sozinha, vai derrotar um exército e ainda o mago mais poderoso do mundo.
Respirei fundo e fechei os olhos. Talvez eu estivesse assustada demais. Talvez começar a sentir o peso do mundo tenha fervido meus nervos, mas eles tinha razão. Eu não conseguiria acabar com uma guerra sozinha. Eu não sou tão extraordinariamente forte para isso. Eu precisaria de toda a ajuda possível.
– Tudo bem, vocês estão certos! – baixei a cabeça – Eu estou muito assustada com tudo isso. Sempre soube que esse momento chegaria, mas agora que ele está prestes a chegar eu não sei como agir.
– Nós entendemos! – Thalassa falou colocando a mão em meu ombro – Acho que está sendo parecido para todos nós. Ninguém nunca havia passado por algo parecido antes. Ofir sempre foi um mundo pacifico, houveram pouquíssimas guerras.
– Nós precisamos nós preparar enquanto é tempo! – disse tentando parecer muito segura.
– E haverá tempo? – Alexis perguntou.
– Precisamos usar o tempo que tivermos! – Neandro estava aparentemente tranquilo – Enquanto os homens de Tales não chegam, seria uma boa idéia nos prepararmos. O que iremos enfrentar será completamente novo e devemos estar prontos para tudo.
– Quando os meus homens chegarem, ficaremos de plantão esperando o exercito de Bianor chegar. – Tales falou seguro.
– Nosso plano é arriscado, mas pode dar certo sim! – Nicardo estava mais animado.
– O plano vai dar certo! – Thalassa sorriu.
– E se o plano não der certo? – voltei a ser realista.
– Não vamos ficar pensando nisso. – Alexis me abraçou.
– Mas ele pode não dar certo. – estava preocupada – O que iremos fazer?
– Não temos um plano B em mente. – Tales fitou preocupado para todos nós – Acho que esse plano não pode falhar de jeito nenhum ou será o fim de Ofir.
– Mas ele vai funcionar! – Alexis se levantou – Nós iremos lutar juntos!
– Para proteger Ofir! – Tales completou.
– Iremos unir nossas forças e nos tornam uma única arma! – Thalassa sorriu.
– Esse vitória será nossa! – Neandro também se levantou.
– Juntos somos imbatíveis! – Linfa segurou a mão de Neandro.
– E não existe mal neste mundo que não poderemos derrotar! – Nicardo pareceu mais confiante.
Levantei-me bem mais confiante e esperançosa. Era engraçado como algumas palavras positivas podem mudar tanto o animo de uma pessoa. Se fossem ditas mais vezes talvez as coisas não parecessem tão ruins.
– Todos juntos nesta batalha! – sorri – E que seja a última!
– Por Ofir! – juntamos nossas mãos e gritamos todos juntos.
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À noite eu tive um sonho muito estranho. Um pesadelo para ser mais exata. E não tinha dúvida de que aquilo era um pressagio do que eu iria viver.
Eu estava novamente no deserto Orestes, mas desta vez era noite e um vento muito forte soprava areia para todos os lados. Raios e trovões pipocavam a cada minuto e chovia pouco para o clima que havia sido formado.
Eu estava muito fraca e via varias pessoas caídas ao meu redor. Alexis, Thalassa, Linfa, algumas pessoas que não conhecia ou não conseguia identificar, estavam todos muito mal e pareciam tentar dizer algo para mim. Eles estendiam as mãos, mas eu não conseguia entender o que eles estavam dizendo. Bianor estava atrás de mim. Ele não parecia bem, mas estava melhor que os outros e eu estava completamente confusa.
De repente a imagem mudou. Eu estava em um local isolado e com uma paisagem bonita. A minha frente estava um tumulo. Não conseguia ler o que estava escrito na pedra do tumulo, mas eu estava muito triste por ter perdido aquela pessoa.
Novamente a imagem mudou. Estava na frente do castelo, vendo uma grande batalha acontecer. Eu queria fazer alguma coisa, mas não conseguia. Eu estava presa.
A imagem mudou novamente, agora para uma grande montanha. Rainha Alina estava na frente de um precipício e atrás dela estava um grande portal. Eu olhei novamente e não era mais a rainha e sim eu que estava prestes a entrar no portal, mas existia algo que me fazia hesita.
A imagem mudou pela última vez. Agora eu estava no mesmo deserto em que sempre encontrava o grande lobo. Como já esperava, ele apareceu e deixou comigo palavras que ecoaram em minha cabeça por muito tempo:
– O que você escolherá deixar para trás no final disso tudo?
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Não percam, dia 29 de agosto, a parte final desta história
HART