O local estava em chamas e ruínas. Paredes caiam, junto com chamas. Estávamos cercados em um labirinto pior do que o que entramos. E ainda não era tudo. Vários portais se abriam e fechavam em vários locais do labirinto. O lugar estava completamente desgovernado.
– E agora? – perguntei – O que faremos?
– Acho que não tem outra forma a não ser entrar nesse inferno. – Alexis não parecia gostar da idéia.
– Mas não é perigoso? Não digo nem por nós. – falei olhando para a Rainha Alina.
– Mas é a única saída. – Alexis olhava em volta.
O teto estava completamente coberto por chamas, formando uma capa laranja que cobria todo o labirinto. As saídas mais seguras estavam bloqueadas por paredes que havia caído e em algumas as chamas já começavam a tomar conta. Alexis tinha razão, não existia outra saída além daquela. Teríamos que entrar no meio do labirinto e enfrentar as chamas.
Estava muito preocupada com a Rainha Alina. Nós poderíamos nos virar caso tivéssemos algum problema, mas ela dependia da gente. A responsabilidade de qualquer coisa que acontecesse com a Rainha Alina seria nossa e eu odiaria carregar essa culpa.
– Já que não temos outra escolha. Vamos! – disse ajeitando a rainha no meu ombro esquerdo.
– Eu só não consigo imaginar para qual destino. – Alexis disse preocupado – Nós não fazemos a mínima idéia de onde é a saída. Será que iremos conseguir?
– Pensamento positivo! – tentei animar-lo, mas não estava com toda essa confiança.
Começamos a analisar o local antes de entrarmos de vez no labirinto. Tentamos encontrar algum caminho que levasse a algum lugar que não estivesse bloqueado. Apesar de muitas paredes terem desabado, o labirinto ainda tinha muitos corredores.
Descemos as escadas com cuidado. Partes dela começavam a cair assim que passávamos por ela. Varias vazes quase caímos metros abaixo. Não lembrava que aquela escada era tão alta. Lembrava que havia uma parede, acompanhado a escada, coisa que já não existia. Estávamos nos equilibrando para não tropeçarmos, mas era difícil fazer isso quando se tem alguém nos ombros. Alexis tentou varias vezes carregar a rainha sozinho, mas eu nunca iria permitir uma coisa dessas. Estávamos ali juntos para toda e qualquer situação.
O labirinto estava mais complicado agora do que antes. Passar por aqueles corredores e chegar com vida ao destino final – seja lá qual for – era mais uma questão de sorte do que de habilidades. E era exatamente isso que me apavorava.
Passamos por vários corredores que davam em saídas bloqueadas. Tentamos ficar calmos e raciocinar o melhor lugar para se passar, mas isso se torna uma situação impossível quando se tem um turbilhão de chamas ao seu redor.
O calor também estava atrapalhando um pouco. Mas esse era dos males o menor, estava preocupada mesmo era com os portais. Eles abriam e fechavam nos mais diversos lugares e não tínhamos idéia de onde poderíamos ser levados caso caíssemos em um desses portais.
No meio do caminho a Rainha Alina começou a dar sinais de vida. Seu corpo se mexia levemente e de vez em outra ela dava algumas tossidas, mas continuava inconsciente.
– Acho melhor a gente parar um pouco para descansar. – Alexis falou já parando.
– Mas e esse fogaréu? – perguntei – Precisamos sair logo daqui antes que nos alcance!
– Beatriz! – Alexis falou um pouco alto – Eu não aguento mais. Preciso descansar um pouco.
– Se ao menos tivesse com os meus poderes... – disse pra mim mesma.
– E àquela hora? – Alexis se sentou e colocou a mãe no colo – Você executou uma magia lá na sala. Será que não consegue outra vez?
– Vou tentar!
Concentrei-me e tentei executar uma magia, mas nada aconteceu. Tentei outra vez e novamente nada. Fiz uma última tentativa, desta vez com mais vontade e continuou não adiantando de nada.
– Vamos ficar só mais um pouco. – disse olhando ao redor – Esse labirinto e bem maior do que eu imaginava.
– E esse fogo? – Alexis perguntou – Já reparou que ele só está onde nós não estamos? Fugimos e fugimos do fogo, mas ele sempre só aparece depois que saímos do local.
– Isso é realmente muito estranho. – concordei balançando a cabeça.
– Beatriz olhe! – Alexis quase deu um grito.
A Rainha Alina começava a acordar. Ela mexia um pouco a cabeça, como se quisesse acordar de um pesadelo e lentamente abriu os olhos.
– Mãe? – Alexis estava emocionado.
– Alexis! – Alina disse um pouco fraca – Mas o que está acontecendo? Eu não deveria estar com você.
– Calma mãe! – Alexis impediu que Alina se levantasse – A senhora precisa descansar.
– Eu estou bem! – Alina tentou se levantar de novo – Eu não deveria estar aqui. O que foi que aconteceu?
– Eu fiz o que me pediu! – disse para Alina segurando a sua mão – Fui proteger Alexis e derrotei os homens com o fogo. Mas o fogo se espalhou por toda a sala e de alguma forma tomou todo o labirinto.
– A sala pegou fogo? – Alina perguntou preocupada – Ela está destruída?
– Acredito que sim. – respondi um pouco acanhada.
– Então está explicado. – Alina se sentou – Aquela sala era o cérebro do labirinto. Toda a energia que era tirada de mim era enviada para sala e redistribuída para o labirinto. Era desta forma que ele sobrevivia. Se a sala está destruída, toda a estrutura do labirinto está comprometida. Ele deve ter perdido o controle e agora todas as armadilhas devem estar desgovernadas.
– E o fogo? – Alexis perguntou.
– É um reflexo do que está acontecendo com a sala principal. Ela, ao invés de enviar energia ao labirinto, está enviando fogo. – Alina respondeu – Só não entendo como eu consegui sair do espelho.
– Nós também não sabemos. – comecei a explicar – Estávamos indo embora quando uma luz surgiu no teto.
– E de repente a senhora estava lá, nos meus braços. – Alexis completou.
– Acho melhor a gente sair daqui antes que o fogo resolva aparecer! – disse cortando o assunto.
– Tem razão! – Alexis concordou – Venha mãe. Eu te ajudo.
– Vamos. Deixe que eu te ajudo também. – ofereci meu ombro.
Continuamos seguindo por corredores infindáveis. Não sabíamos onde poderíamos chegar, mas sabíamos que tínhamos que chegar a algum lugar. De preferência um lugar seguro. E como se já não bastasse, a nossa situação ainda piora quando viramos um dos corredores.
Pareciam que estavam apenas esperando por nós. Três grandes e gosmentos monstros estavam parados, se rastejando pelo chão. Eram três bichos com corpo de cobra, porem com patas dianteiras de um jacaré e cabeça de águia.
– Era só o que faltava. – Alexis grita nervoso.
– E agora? – perguntei.
– Deixem comigo! – a Rainha Alina falou um pouco cansada.
– Não mãe! – Alexis já foi impedindo – Você não pode lutar.
– Nós iremos te proteger rainha! – disse colocando bem devagar a Alina no chão.
– Mas que tipo de bicho é esse? – perguntei.
– Não faço a mínima idéia! – Alexis respondeu.
– Mas como iremos matar-los se não podemos usar poderes? – um surto de realidade me veio no momento.
– Com aquilo!
Alexis apontou para duas espadas cruzadas penduradas em uma das paredes. Fala sério? Isso não é algo que se acontece todo dia. Seja lá o que a sorte estivesse planejando para mim, bem, até agora eu estava agradecida.
Pegamos as espadas e tentamos manter os monstros longe da rainha antes de começar a atacar. Arrastamos as espadas no chão, fazendo algumas fagulhas de fogo aparecerem e depois ameaçamos atacar. Os bichos recuaram e emitiram um som agudo que ecoou por todos os corredores.
– Vamos tentar ficar mais próximo da Rainha Alina. Não é seguro ficar tão longe dela! – sugeri quando reparei que a rainha estava quase sumindo do nosso campo de visão.
– Você tem razão. – Alexis olhou para trás.
Demos alguns passos para trás e atraímos os bichos para mais perto de nós. Um dos monstros tentou atacar, mas acabei defendendo com a espada, cortando levemente sua pata. Outro grito agudo.
Os outros dois monstros começaram a recuar, mas logo voltaram e tentaram atacar. Eu e Alexis esquivamos e tentamos dar o revide, mas eles também se esquivaram.
– Pelo jeito eles são mais inteligentes do que presumi. – Alexis sussurrou – Temos que agir com cuidado.
Assenti e caminhei lentamente em direção a um deles. Alexis fez o mesmo. Os monstros recuavam e ameaçavam. Ficamos nisso por alguns minutos até que um deles resolveu atacar. Alexis defendeu no mesmo instante arrancando um dos dedos do monstro fora. Tivemos outro grito agudo e o monstro começou a atacar com mais ferocidade. Os outros entraram no embalo.
Eu e Alexis entramos em modo de defesa e a todo minuto olhávamos para a Rainha Alina, conferindo se estava tudo bem. Os monstros continuaram atacando e nós defendendo, até que Alexis aproveitou uma deixa e atacou. Ele arrancou a cabeça de um dos monstros, que caiu no chão tremendo até o corpo inteiro ficar em pedaços. Também aproveitei a distração dos monstros e ataquei o outro, também na cabeça. O monstro seguiu os passos do companheiro e tremeu até ficar em pedaços.
– Agora somos dois contra um! – Alexis falou sorrindo.
– Alexis, olhe! – gritei.
No chão, os pedaços dos monstros começaram a se juntar e formaram 1 novo monstro. Sua forma era irregular e as partes haviam se juntado no lugar errado, fazendo as patas ficarem junto à cabeça – que estava virada ao contrario – e as partes da cauda estavam deformadas e montadas de forma estranha.
– Corrigindo, dois contra dois. Luta justa! – Alexis falou mais sério desta vez.
Continuamos lutando. O monstro que se remontou estava mais forte que o outro, por isso acabamos prestando mais atenção nele. O outro monstro seguiu a estratégia do inicio recuando e ameaçando atacar, enquanto o monstro remendado tentava atacar. Ele teve dificuldades em atacar por causa da nova localização dos seus braços, mas em compensação estava mais resistente aos nossos ataques.
– O que nos iremos fazer? – perguntei.
– Não sei, mas não podemos deixar que eles cheguem perto da minha mãe! – Alexis falava firme.
– Se ao menos conseguíssemos executar algum poder. – lamentei.
– O pior é que não sabemos a forma correta de matar-los. – Alexis se esquivava dos golpes do remendado.
– O jeito é continuar lutando! – falei.
– Lutando até nos cansarmos? – Alexis parecia não gostar da idéia.
– Mas é a única opção que temos! – tentava encontrar outra solução.
– Tem que haver outra forma. – Alexis também parecia estar pensando em outra solução – Nós precisamos sair daqui.
– E rápido! – acrescentei.
– E o fogo que não aparece quando a gente precisa? – Alexis estava muito irritado.
Continuamos lutando contra os monstros. Tentamos evitar destroçar-los. Queríamos também tempo para pensar em uma saída, mas estava difícil demais.
Os monstros começaram a atacar de verdade e nós não tivemos outra escolha a não ser revidar.
Eu fiquei com o monstro remendado. Por mais que Alexis demonstrasse querer lutar contra ele, eu não podia deixar-lo fazer isso. Ele já tinha lutado com os homens sombra e deveria estar mais cansado que eu. Seria muito injusto ele ficar com a mais forte, sendo que ele não estava em condições de vencer-lo. Não que eu estivesse com chances maiores, mas pelo menos eu demoraria mais em cansar. E quem sabe até lá não descobriríamos um jeito de escapar daquela emboscada?
Ataquei sem dó o monstro, mas a espada fazia apenas pequenos cortes onde acertava. O monstro aproveitava minha aproximação e me pegava pelo braço, atirando-me contra a parede. Tentei amortecer o impacto com os pés e aproveitei para pegar impulso e pulei para cima de sua cabeça, acertando-lhe com a espada.
Alexis e o outro monstro estavam novamente nas ameaças, exceto por uma e outra vez que um deles atacava. A luta parecia bem mais pesada do meu lado. Alexis tentou perfurar o monstro na barriga, mas ele esquivou. O monstro conseguiu fazer um leve corte na perna de Alexis, o que me fez chamar atenção para luta.
Ver Alexis sangrar me deixou louca. Pulei das costas do retalhado e fui com tudo para cima do monstro que estava com Alexis. O impacto foi tão grande que acabei derrubando o monstro no chão. Sem pensar acabei cortando a cabeça do monstro e esquecendo o que tanto estava tentando evitar.
Assim como os outros dois monstros, ele tremeu e se desfez em vários pedaços. Poucos segundos depois ele também se juntou ao monstro retalhado, fazendo-o ainda mais estranho e horrendo.
Agora com 2 metros de altura, 2 cabeças, 4 braços e 2 caudas igualmente deformadas o monstro parecia uma criatura invencível. O seu grito agudo era muito mais alto e irritante que os dos outros monstros e parecia muito mais resistente.
– O que iremos fazer agora? – perguntei.
– Acha que devemos correr? – Alexis retrucou.
– Não vejo uma alternativa melhor. – respondi.
Alexis pegou a Rainha Alina e colocou em suas costas. Ele parecia muito cansado, mas motivado. Querer salvar a mãe parecia estar dando uma força sobre-humana a ele.
O monstro pareceu perceber o que estávamos tentando fazer e deu um pulo, fazendo o chão tremer e as paredes caírem, bloqueando a passagem. Se duas cabeças pensam melhor que uma, três devem trazer idéias brilhantes – pelo menos para o nível de inteligência deles.
– E agora o que faremos? – perguntei quase atropelando as palavras.
– Agora eu realmente não sei! – Alexis parecia realmente desesperado.
– Eu sei! – Alina disse quase que sem som algum.
– Não mãe! – Alexis se antecipou – Não irei deixar a senhora lutar!
– E quem aqui está falando em luta? – mesmo fraca, senti um tom de deboche em sua voz.
– Então o que está pensando? – perguntei.
No mesmo instante notei que um portal estava se abrindo. Ainda não conseguia enxergar para onde ele levaria, mas já imagina qual era a idéia da Rainha Alina.
O portal se abriu um pouco mais e consegui ver o local. Era o local onde a Rainha Alina estava aprisionada.
– Quando eu disse já. – Alina falou baixo.
– Já entendi! – continuei fixando no portal enquanto o monstro se aproximava.
– Do que vocês estão falando? – Alexis ainda não tinha percebido a idéia.
– Já! – desta vez a Rainha Alina gritou bem alto.
Não esperei duas vezes e dei um salto bem alto me jogando para cima do monstro. O monstro desequilibrou, mas não caiu. Teria que ser rápida. Continuei forçando o meu peso para que o monstro virasse e caísse no portal antes que ele fechasse. O monstro relutou, mas consegui fazer-lo perder o equilíbrio. Rapidamente dei um salto para trás e o monstro caiu no portal que se fechou no exato momento em que ele caiu.
– Beatriz? – Alexis estava de boca aberta.
– Eu sabia que conseguiria! – a rainha deu um leve sorriso.
– Mas a idéia foi sua majestade! – fiz uma reverencia.
– Não há necessidade dessas formalidades comigo. – Alina estava fraca, mas ficou de pé – Já esqueceu que eu sou sua sogra?
– É verdade! – disse sorrindo.
– Fico feliz em ver que estão se dando bem, mas nós precisamos sair daqui! – Alexis cortou o “momento descontração” – E precisamos sair rápido, antes que o fogo nos alcance. Não sei nem como ele ainda não nos alcançou.
– E nem irá nos alcançar! – Alina disse baixo – Esse incêndio não é fruto de uma magia de Beatriz?
– Sim! – respondi – Acho que o feitiço se virou contra o feiticeiro, como diz o ditado.
– Um feitiço nunca se volta contra o feiticeiro. – Alina sorriu – Seja lá quem inventou essa frase, ela está completamente errada. Nenhum feitiço que você executar irá se voltar contra você. A menos que você deseje isso.
– Mas nós continuamos presos aqui. – Alexis olhou em volta – Não temos saída.
– Eu também não faço a mínima idéia de como sairemos daqui. – disse olhando para Rainha Alina.
– Eu acho que a saída virá em breve. – Alina estava calma – Não precisa se desesperar. Só temo pela Capital.
– O que tem a Capital? – Alexis ficou nervoso.
– Bianor está seguindo para invadir a Capital. – respondi.
– Eu senti isso enquanto estava presa. – Alina completou – Senti que o exercito de Bianor também se fortaleceu. Se não agirmos rápido a Capital pode ser destruída.
– E por que não me contaram antes? – Alexis se irritou – A Capital em perigo e nós aqui presos!
– Alexis, não houve tempo. Você viu. – comecei a explicar a situação – Saímos da sala principal direto para esse labirinto e depois ainda tivemos que enfrentar os monstros. Mas nós iremos conseguir chegar a tempo.
– Como? – Alexis gritou – Até a gente sair desse labirinto. Se a gente sair, vai demorar muito de barco.
– Mas quem disse que iremos de barco? – Alina sorriu.
– O que está falando? – Alexis e eu perguntamos ao mesmo tempo.
– O nosso transporte acabou de chegar!